O gato que não tem vertigens chama-se Jó e na verdade o Jó é um filme português. Não, não é estranho – é uma história nada estranha e talvez apenas um pouco fora do comum. Porque na vida real fora da tela, já que dentro também tudo é real até o que é fantasia, os pré-adultos, ou pós-adolescentes, não se interessam por velhos e os velhos não têm grande paciência para as febres de borbulhas à noite dos pós-adolescentes. Ou dos pré-adultos.
Por debaixo do filme os gatos não têm vertigens há o drama social e o drama humano – e há a comédia: o final feliz que vence; o sorriso de que todos precisamos quando tudo em volta é pardo.
O argumento tem a assinatura de Tiago Santos e terá começado a ser escrito pouco depois de António-Pedro Vasconcelos ter rodado “A bela e o paparazzo”, há três anos. Agora, vou apagar a luz.
Novo filme de António-Pedro Vasconcelos, Jó, o gato que não tem vertigens, leva ao grande ecrã as diferentes gerações – e desta vez sem conflito
Era uma vez o amor. Porque o amor pode viver em qualquer um – até em um gato desconfiado, porém sedento de festas, e sem vertigens. À moda de Kundera é a vertigem do gato que não a tem, isto é, não tem vontade de cair sem arrependimento. Como é o amor. Mas este gato não é o de kundera, é o do António-Pedro Vasconcelos e não tem vertigens. Pronto. Afinal é um gato convencional.
Estamos em Lisboa em tempos de crise, (não estamos todos?) e o Jó, que é o João Jesus, faz 18 anos ao mesmo tempo que é colaborador de um roubo. (colaborar é um verbo excelente para designar os participantes em um mercado de trabalho em expansão)
Como estava a dizer, falava do Jó, o rapaz que é ignorado pela mãe passa a ser também ostracizado pelo pai que o expulsa de casa. E sem tecto nem afecto, mete-se no terraço do prédio da Rosa. A Rosa é uma recém viúva com 73 anos e que vive com a solidão. (a solidão pode ser uma excelente companhia mas não sabe sorrir)
Contar histórias do arco da velha: do novo e da velha por um velho
O novo Jó é desconfiado como os gatos, já se sabe, e só come o que a velha Rosa lhe dá às escondidas porque não sabe o que é ser amado nem sabe receber carinho. (afinal com quem vive a solidão – com o novo ou com a velha?) Também não sabe confiar, este gato que não tem vertigens. Mas vai aprender – ou será que é mais a Rosa que vai ensinar-lhe (?)
Só os velhos percebem de amor e há novos que sabem ser velhos. É o caso do realizador, António-Pedro Vasconcelos, que aos 75 anos reconhece que a única coisa positiva que pode falar às pessoas é o amor: “É o meu único filme de amor, verdadeiramente. Precisei de chegar a esta idade para conseguir falar do amor como eu gostava”.
(continua. mas nas salas de cinema.)