As bibliotecas já não são o que eram: são, têm vindo a ser, melhores. As primeiras, materializadas em placas de argila, onde se registavam contas de templos e de trocas comerciais, datam de há 3000 anos Antes de Cristo e são relíquias que apenas servem para nos fazer lembrar que nem sempre foi assim como é hoje: o livro, um mundo, liberdade, ao alcance de todos.
E, o que seria das bibliotecas, se não tivesse sido inventada a imprensa?
Ainda sou pelo tradicional conceito de livro – onde há o toque e o cheiro e a timidez do olhar nas letras enquanto não nos fazem nelas confiar para continuarmos até à última página. E você?
A primeira das bibliotecas pública de que há conhecimento localizava-se em Atenas e constituía, na graciosa Grécia clássica, além de consulta de manuscritos, local de encontros para discussão e elaboração de projectos. Na história ficou igualmente a biblioteca de Alexandria – espaço com milhares de rolos para leitura, oficina de copistas ou amanuenses e arquivo de documentação oficial. Mas terão sido os Romanos os primeiros a fazerem das bibliotecas públicas instrumentos de dominação intelectual – propagando-se, assim, as bibliotecas particulares como símbolos de riqueza e prestígio -, uma moda.
Foi nesta época que os copistas começaram a surgir em massa – trabalho desempenhado por escravos – assim como os Codex em pergaminho que substituíram os, até então, rolos de papiro. Seguiram-se guerras e destruições que travaram a expansão das bibliotecas e a concentração dos resquícios manuscritos em mosteiros, conventos e castelos feudais: aqui aqueles eram conservados, copiados, traduzidos e ilustrados mas também monopolizados e tornados inacessíveis ao povo. No mundo Árabe a expansão das bibliotecas foi, durante a idade média, impressionante durante fazendo a delícia de professores e estudantes no reino da matemática, astronomia e filosofia.
Com o surgimento das universidades, na Europa, os livros passam a ser um luxo intelectual, apesar de acorrentados para inibir o roubo, partilhado. O livro reencontra o simbolismo de riqueza e de prestígio – que Gutenberg, esquecê-lo é pecado, em muito contribuiu – na Idade Moderna. Que maravilha. Nascia o primeiro livro impresso que vinha a permitir a transmissão do conhecimento a uma escala nunca antes vista. Apenas, no entanto, no século dezassete as bibliotecas viriam a ser públicas quebrando-se a excepção de frequência aos ditos sábios. É no século dezoito que surgem as bibliotecas nacionais e no século seguinte é fundada a maior biblioteca do mundo, nos EUA, a do Congresso. Aos antigos conceitos e actores do mundo do livro juntavam-se o autor, o impressor, o livreiro, o editor, o bibliotecário e, finalmente livre, o leitor.
Mudaram-se os tempos, assim como as vontades e as necessidades: o combate ao analfabetismo e a cada vez maior preocupação com a educação deixaram, de vez, as portas abertas ao livro no século vinte, século que fez desenvolver, e instituir, um novo mundo ao mundo do livro. Nos nossos dias as bibliotecas não possuem apenas um carácter documental e informativo in loco – antes deixaram que o tempo lhes refrescasse as tecnologias e os recursos e, ninguém lá longe alguma vez imaginou, entra-nos casa adentro, espaço físico superado, por via virtual. Hoje é possível acedermos a bibliotecas virtuais e digitais sem termos, sequer, de nos deslocar. Faremos ideia de como será num futuro mais distante? Talvez nessa altura os cérebros já estarão apetrechados, ritual simultâneo com o corte do cordão umbilical, com uma memória ram onde estará toda a informação disponível para download.
(esta artigo está escrito ao abrigo da antiga ortografia)
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